"Sem música não há vida, não há vida sem música"





segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Canções em Versões:"I'm Through With Love" III, Marilyn Monroe





Recordamos com esta cena da comédia de Billy Wilder Some Like It Hot (1959) o papel em que Marilyn terá porventura estado mais próxima de si mesma, o da cantora de uma orquestra de mulheres (All-Girl Band) Sugar Kane. Ela é "uma comediante que nos faz vir as lágrimas aos olhos, por exemplo nesta cena em que canta "I'm Through With Love", uma canção de lamento e descrença no amor, exatamente no momento em que volta a apaixonar-se". 1

Quanto a Joe, disfarçado de Josephine para escapar aos gangsters de Chicago, arrisca neste beijo, com que reconhece a interpretação de Sugar, não só o seu namoro com ela no outro disfarce
 de milionário, mas a própria vida, uma vez que os gangsters o perseguem nesse instante no hotel da Flórida onde a maior parte do filme se desenrola.

Os elementos de comédia não se devem apenas ao talento inato de Marilyn para o registo cómico, salientado em várias ocasiões por Wilder, mas à inadequação da situação: o comovente lamento da canção que interpreta não se adequa à situação que a personagem de Sugar Kane vive nesse momento, e o realizador conseguirá o cómico perfeito na cena, mostrando a já então sex symbol americana a ser beijada apaixonadamente por uma mulher (na verdade, um homem disfarçado de mulher, Tony Curtis no papel de Joe/Josephine). A inadequação e absurdo da cena contrastam com  a situação dramática das personagens, ao mesmo tempo que a acentuam: Marilyn está a apaixonar-se exatamente pelo tipo de homem que mais receia, um saxofonista, ainda por cima duplamente disfarçado de mulher e de milionário; Joe/Josephine, por seu lado, interrompe a fuga aos gangsters no hotel para escutar "I'm Through With Love", e sob efeito da canção acaba por revelar, com o beijo e comentário, a sua identidade a Sugar, e ultrapassar, por empatia com ela, a sua perspetiva sexista. 2

Dirigida por Wilder, Marilyn fez em grande parte a singularidade deste filme, que retoma ideias de dois filmes anteriores, um francês e outro alemão, Fanfare d'amour de 1935 e Fanfaren der Liebe de 1951, histórias semelhantes a Some Like It Hot, mas sem gangsters e sem Marilyn Monroe.

1 Vd. Sinyard, N. / Turner, A., Billy Wilders Filme. Berlin: Verlag Volker Spiess, 1980, e Karasek, Hellmuth, Billy Wilder. Hamburg: Hoffmann Campe Verlag, 1992
2 Vd. id. ibid.

2 comentários: